Me permito, por meio dessa carta, compartilhar minha experiência de intercâmbio.
Ao primeiro mês, lembro-me com carinho das minhas pequenas grandes aventuras. "Quais eram os mercados mais baratos? " "Quais deles têm frutas baratas?" "Desculpe, não sabia que precisava pesá-las antes de ir ao caixa". "Como pego o metrô?" "E o trem?" "Como chego lá?" "Quanto tempo dura o bilhete?" Quanto à universidade, "como funcionam as aulas?" "Quais as diferenças entre essa metodologia e aquela?" "Onde está o plano de ensino?" "Quais matérias escolho?"
De algum modo, tudo parecia tão novo que às vezes esses momentos pareciam um sonho de uma realidade lúcida, de uma realidade nova, que eu tinha o controle e ao mesmo tempo não tinha. Lembrando desses momento com carinho, sinto o quanto essa experiência me mostrou quase em matéria de realidade do que eu sou capaz.
Quanto ao segundo mês, já sabia meus mercados favoritos, já tinha decidido minhas matérias na faculdade e já utilizava do transporte sem usar o aplicativo e sem acompanhar o mapa no celular.
No terceiro mês, que completei semana passada, percebo que as pequenas aventuras se tornaram parte da minha rotina, na medida em que elas não representavam de fato um grande desafio. O mistério de novas experiências do cotidiano, somado com um idioma novo cujo domínio ainda está por vir, traziam uma pequena tensão. Mas uma tensão que traz carinho. Que me permite me descobrir e descobrir o mundo. Que me permitiu uma imersão com o que posso, com o que não posso, com minhas potencialidades e com minhas fraquezas.
Me sinto mais próxima de mim. Me sinto ainda mais próxima e ainda mais parte do mundo. Sinto que o que vivo aqui é de um crescimento pessoal imenso, e também profissional. Meu estudo é as relações humanas, seus significados. O que vivo aqui é campo de estudo, o tempo todo.
E talvez eu não entendia muito sobre como 90 dias seriam o tempo de adaptação; entretanto, hoje, percebo que 3 meses era o tempo que eu precisa pra me permitir cada vez mais agir e interagir em cada pequeno momento, seja na faculdade ou na boulangerie. Se doar, aceitar os momentos. Se a saudade bater, a aceito. E não posso deixar de comentar, a saudade aparece de diversas maneiras. Em pessoas, obviamente, saudade de família, de amigos queridos.
Três meses que troquei meu hábito de arroz de feijão para o almoço, para meu croissant de café da manhã. Três meses que troquei minha cerveja qualquer para meu vinho qualquer. Três meses que troquei minhas aulas que me faziam refletir sobre a vida para aulas que me fazem refletir sobre a vida também, mas com um tempero de cultura estrangeira. Com um tempero que não cresce no Brasil, pela simples razão de que não ser o mesmo terreno, e nada mais. Pela simples razão que aqui as construções sociais são diferentes, em inúmeras pequenas coisas. E logo, o jeito de construir ciência e educação também.
Minhas pequenas aventuras são a graça de viver na França. São momentos tenros, únicos. Gostaria de agradecer infinitamente essa possibilidade. É difícil transpor em palavras o quanto isso tudo é enriquecedor para mim, pessoalmente é profissionalmente.
Obrigada pela oportunidade.
Sei que a faculdade Mackenzie valoriza essa experiência o tanto quanto eu, afinal, a oportunidade surgiu mediada por vocês.
Mais uma vez, obrigada. Meu coração se enche de amor e carinho, cada vez mais pela França e cada vez mais pelo Brasil também.
Com muito amor,
Lais tarelho