A importância do acompanhamento sistemático da atividade do Congresso Nacional, sob a perspectiva da Liberdade Econômica: a proposta de trabalho do Observatório do Legislativo para o ano de 2018

05.06.2018

Prof. Dr. Paulo Rogério Scarano, Prof. Dr. Maurício Loboda Fronzaglia, Prof. Dr. Clayton Vinicius P. de Araújo e Prof. Dr. Elton Duarte Batalha


O ano de 2018 será politicamente desafiador. Haverá eleições para cargos executivos (governadores e presidente), e legislativos (deputados estaduais, deputados federais e senadores). A despeito da necessidade de importantes decisões que dependem do Congresso Nacional, como a reforma da Previdência, há uma forte tendência de que os congressistas, preocupados com suas candidaturas, não votem temas impopulares e mesmo que a atividade legislativa seja esvaziada no segundo semestre. Some-se a isso o risco de decisões populistas, que, sob o pretexto de garantir “direitos” acabam por impor custos adicionais para o cidadão, em termos de liberdade econômica.

 

O poder legislativo é uma das bases do funcionamento democrático pela importância das suas atribuições na divisão de poderes (ANASTASIA; INACIO, 2006). Em uma sociedade democrática diversos grupos sociais defendem seus interesses e suas visões de mundo por meio da disputa eleitoral e das interações próprias do funcionamento dos órgãos que compõe o governo. Nessas interações, o poder legislativo é uma das arenas institucionais privilegiadas onde diferentes ideias, representando os diversos grupos de interesse, categorias sociais e atores que constituem a sociedade se encontram, se aliam ou entram em confronto. 

 

Fazer uma análise da atuação dos congressistas, em matérias de âmbito econômico, serve para entender como os interesses e atores econômicos se articulam, entram em conflito, cooperam e expressam suas visões de mundo e dos eleitores que representam. O Congresso Nacional é um dos locais onde se entrelaçam e se influenciam as esferas política e econômica da sociedade. As relações entre agentes do poder político e do poder econômico (em suas diversas formas) podem se expressar e se concretizar na proposição de leis feitas neste poder legislativo.

 

Sabe-se, também, que as leis aprovadas pelo Congresso Nacional são, em sua maioria, de autoria do poder executivo no uso das suas prerrogativas legislativas. Não é novidade que a relação entre os poderes é marcada por essa assimetria. É uma das características do presidencialismo brasileiro desde a redemocratização (ABRANCHES, 1988). Deve-se levar em conta a dinâmica da relação entre os poderes e suas necessárias contextualizações. Mesmo porque, as relações entre os dois poderes se encaixam em uma lógica de mútuas influências que se expressam desde o poder de agenda até o de aprovação de uma determinada medida (SANTOS, 1997).

 

Justifica-se, então, a necessidade de monitorar, sob a perspectiva do livre mercado, as atividades do Congresso Nacional, pois existe uma relação direta, positiva e significativa entre liberdade econômica e desenvolvimento humano, como é possível observar na figura abaixo.

> VER TABELA AO LADO <

Tal relação pode ser explicada porque a condição necessária para que haja desenvolvimento humano é o crescimento econômico. Por sua vez, para que haja crescimento econômico é necessário investimento em capital físico e em capital humano. Investimentos demandam formação de capital. Esta, por sua vez, depende de condições institucionais favoráveis ao ambiente de negócios, implicando, em linha com Gwartney; Lawson; Hall (2017) do Fraser Institute, que:

●       o governo não pode tributar demais o setor privado, que é a parcela produtiva da sociedade. Tributos em excesso desincentivam a produção, minam a competitividade e comprometem a formação de capital. Se o governo não deve tributar demais, seus gastos também devem ser contidos, pelo bem da sustentabilidade fiscal. Assim, o Estado não pode ser agigantado;

●       os direitos de propriedade devem ser bem definidos, de modo a garantir que os indivíduos possam usufruir plenamente do resultado de suas atividades;

●       o valor da moeda deve ser preservado, de modo a garantir o horizonte de cálculo econômico. Isso implica que não deve haver financiamento inflacionário do governo;

●       a liberdade de comércio internacional deve ser garantida, de modo a não restringir a demanda dos produtores apenas ao mercado doméstico, ao mesmo tempo em que deve ser garantido às empresas e famílias o direito de comprar (livres de protecionismo) bens e serviços do exterior, para que a competição garanta os menores preços possíveis para insumos e bens de consumo;

●       a regulação sobre os mercados de crédito, de trabalho e empresarial seja muito parcimoniosa para evitar os riscos associados à captura regulatória e ao compadrio. Ademais, os indivíduos são os melhores juízes de seus interesses e, como apontado por Hayek (1937), o conhecimento é disperso, sendo impossível, portanto, que um governante, por melhores que sejam suas intenções, consiga obter todas as informações necessárias para maximizar o bem estar dos cidadãos.

 

Diante do cenário desafiador do ano eleitoral de 2018, um dos objetivos centrais do Observatório do Legislativo do Centro Mackenzie de Liberdade Econômica será monitorar como a atuação do Congresso, ao votar as propostas legislativas do executivo e ao formular e votar seus próprios projetos de lei, interfere na liberdade econômica dos cidadãos. O monitoramento do Congresso Nacional, no ano legislativo de 2018, buscará mapear e analisar, sob a perspectiva da liberdade econômica:

  1. a votação de todos os projetos de lei, medidas provisórias e projetos de emenda constitucional enviados pelo executivo ao Congresso Nacional;
  2. o resultado de todas as votações de projetos propostos pela Câmara, que transitaram pela Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços (CDEICS) e pelo Senado, que transitaram pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE);
  3. todos os projetos de lei apresentados pelo Congresso Nacional neste ano com poder para afetar a liberdade econômica.

 

O levantamento será feito a partir das informações disponíveis no próprio site das casas que compõe o Congresso Nacional. Esse levantamento será dividido em duas etapas:

  1. descritiva, que buscará identificar os autores, filiações partidárias e qual a categoria dos projetos;
  2. analítica, que procurará identificar:

 

a) quem se beneficia da legislação proposta,

b) qual a justificativa apresentada e

c) quais os impactos, em termos de liberdade econômica.

 

Para a etapa analítica, recorrer-se-á às técnicas de análise de conteúdo das ementas das leis, que permitirão a identificação dos beneficiados e a categorização das justificativas apresentadas. Essas técnicas auxiliarão na identificação de quais interesses e valores estão sendo defendidos na atividade parlamentar. O processo de categorização será definido a partir do uso de palavras chave apropriadas ao objetivo deste monitoramento. Já para a avaliação dos impactos para a liberdade econômica, este estudo se valerá da metodologia do Fraser Institute, uma vez que já há uma parceria com esse instituto em outros trabalhos do Centro Mackenzie de Liberdade Econômica. Alinhado com o Índice de Liberdade Econômica do Fraser Institute (GWARTNEY; LAWSON; HALL, 2017), o trabalho avaliará se a legislação proposta afetará:

  1. O tamanho do governo ao a) impor mais gastos, transferências e subsídios; b) ampliar a participação estatal na economia; c) aumentar as alíquotas dos impostos. Para o fim do presente trabalho, a ampliação do tamanho do governo é entendida como redução da liberdade econômica.
  2. O sistema legal e os direitos de propriedade, pois intervenções no sistema legal e restrições ao direito de propriedade tendem a gerar insegurança jurídica, aumentar os custos de transação e a reduzir a liberdade econômica.
  3. A estabilidade monetária e a possibilidade de possuir contas bancárias em moeda estrangeira. A inflação e a dificuldade de utilizar outras moedas nas quais os agentes confiem minam os ganhos do comércio, gerando distorções nos preços relativos, afetando os fundamentos dos contratos de longo prazo e diminuindo o horizonte de cálculo econômico, o que, por sua vez, reduz a liberdade econômica.
  4. A liberdade de comércio internacional, levando-se em consideração tarifas, barreiras não tarifárias, câmbio e liberdade de movimentação de capitais e pessoas. Restrições tarifárias e não tarifárias ao comércio e obstáculos à livre movimentação de fatores reduzem a liberdade econômica.
  5. A regulação dos negócios e dos mercados de crédito, e de trabalho. Buscar-se-á avaliar se a regulação proposta tende a impor limites à atuação do setor privado e a criar custos associados à burocracia, reduzindo a liberdade econômica. (GWARTNEY; LAWSON; HALL, 2017)

 

Para cada caso em que a liberdade econômica for afetada negativamente, será realizada uma avaliação crítica, expondo seus possíveis efeitos. Os resultados do esforço de monitoramento do Congresso Nacional, sob a perspectiva da Liberdade Econômica, serão apresentados em dois formatos distintos:

1)      artigos de divulgação, com a apresentação e análise de projetos de lei específicos que influenciam a liberdade econômica sob a forma de “Notícias do Legislativo” no site do Centro Mackenzie de Liberdade Econômica.

2)      relatórios sobre a atividade do Congresso estruturados da seguinte maneira :

●       Seção 1 - Como as casas do Congresso votaram as propostas do Poder Executivo no período

●       Seção 2 - Novos projetos que impactam a liberdade econômica submetidos às mesas diretoras no período

●       Seção 3 - Projetos com impacto na liberdade econômica votados no período

 

Assim, o Observatório do Legislativo procurará oferecer uma contribuição substancial para a sociedade, fornecendo dados e esclarecimentos sobre o funcionamento e a atuação de umas das mais importantes instituições da democracia: o Congresso Nacional, destacando seu posicionamento relativo às atividades que impactam o exercício da liberdade econômica, que, conforme exposto, está correlacionada com o desenvolvimento. Pretende, desse modo, estimular e participar ativamente do debate político-econômico, oferecendo a perspectiva analítica do Centro Mackenzie de Liberdade Econômica.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABRANCHES, Sérgio Henrique. "O presidencialismo de coalizão: o dilema institucional brasileiro". Dados, 31(1), 1988, p. 5-33.

ANASTASIA, Fátima; INÁCIO, Magna. Democracia, Poder Legislativo, interesses e capacidades. Cadernos AsLEGIS, nº 40, maio/ago de 2010.

FRASER INSTITUTE. Economic Freedom. Disponível em: <https://www.fraserinstitute.org/economic-freedom/dataset?geozone=world&year=2015&page=dataset&min-year=2&max-year=0&filter=0>. Acesso em 09 mar. 2018.

GWARTNEY, James; LAWSON, Robert; HALL, Joshua. Economic Freedom of the World: 2017 Annual Report. Vancouver: Fraser Institute, 2017. Disponível em: <https://www.fraserinstitute.org/studies/economic-freedom>. Acesso em: 05 mar. 2018.

HAYEK, F. A. Economics and Knowledge. Economica IV, new ser., p. 33-54, 1937.

SANTOS, Fabiano. Patronagem e Poder de Agenda na Política Brasileira. Dados, Vol. 40, nº3. Rio de Janeiro, 1997.

UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAMME. Human Development Reports. Disponível em: <http://hdr.undp.org/en/data>. Acesso em 09 mar. 2018.

 

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