Quanto os candidatos se aproximam ou se afastam dos princípios do livre mercado?
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Avaliação da Entrevista de Jair Bolsonaro ao Jornal Nacional

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Avaliação da Entrevista de Jair Bolsonaro ao Jornal Nacional

Em uma iniciativa da Rede Globo, os cinco candidatos mais bem posicionados nas pesquisas de intenção de votos foram entrevistados na bancada do Jornal Nacional, cuja audiência é a maior da televisão brasileira. Foram, portanto, convidados e sorteados previamente a fim de ordenar as entrevistas: Ciro Gomes, Jair Bolsonaro, Geraldo Alckmin, Marina Silva e Fernando Haddad.No projeto em voga que objetiva realizar uma análise de conteúdo das falas dos presidenciáveis, buscou-se, sempre, trazer à tona os temas atinentes à economia, especialmente no que tange à liberdade econômica.

25.09.2018

Rodrigo Augusto Prando e Paulo Rogério Scarano


JAIR BOLSONARO

 

Em entrevista, Jair Bolsonaro, foi questionado sobre alguns temas. Inicialmente, foi indagado como ele pode se apresentar como “novo”, na política, se está em exercício de mandato parlamentar em torno de 27 anos, bem como seu patrimônio amealhado ter sido fruto de sua atuação na política e de ter, ainda, sido capaz de eleger seus filhos, formando, como outras, uma família de políticos.

 

Na sequência, foi trazido à tona, a seguinte questão:

“É um tema caríssimo aos brasileiros, importantíssimo nesse momento. Sobretudo nesse momento que o país está enfrentando. O senhor diz, com sinceridade até, que o senhor não entende de economia. E que quem vai cuidar desse assunto no seu governo, caso eleito, será Paulo Guedes, um economista. A questão é: em nenhuma democracia do mundo há notícia de um candidato a chefe de estado que, com tamanha antecedência, ao longo de uma campanha eleitoral, já tenha delegado tamanho poder a um futuro subordinado. O que é que o senhor diria a um eleitor que esteja preocupado com a possibilidade de o senhor se tornar um refém de um subordinado tão poderoso, em quem o eleitor nem vai votar?”

 

Na resposta, Bolsonaro afirmou que:

“Primeiro, o Lula, que não entendia de economia, teve um ministro da mesma, médico. Dilma Rousseff, que entendia de economia, levou o Brasil ao caos. Eu parto do princípio que você tem que confiar nos homens e nas mulheres. Eu às vezes me pergunto o que o senhor Paulo Guedes viu em mim. Ele já me respondeu: “Vi sinceridade e vi confiança”. Eu tenho que confiar nele, como tenho que confiar no meu ministro da Justiça, o da Defesa, o da Agronomia, entre outros”.

 

E completa:

“E o Paulo Guedes é um economista reconhecido, dentro e fora do Brasil”.

 

E, na sequência, foi questionado da diferença salarial entre homens e mulheres, no Brasil:

“Candidato, vamos falar agora de um tema muito importante também, que é desigualdade de gênero. Segundo o IBGE, as mulheres ganham 25% menos que os homens. O senhor já disse que no serviço público já há a garantia dessa igualdade salarial. E no setor, na iniciativa privada, vale o que o empregador... O livre-arbítrio do empregador. O senhor já disse que um presidente da República, na sua opinião, não pode fazer nada a respeito para mudar esse quadro. O fato é que o senhor afirmou que, se fosse empregador, não empregaria mulheres com os mesmos salários dos homens. Ou seja, o senhor se solidariza pessoalmente com os empregadores que compartilham dessa desigualdade salarial. Como explicar isso às mulheres?”

 

Depois de rápida discussão se a entrevistadora tinha lido e ouvido e onde, tal afirmação, o candidato afirma que num programa televisivo, da apresentadora Luciana Gimenez,  quando questionado sobre a diferença salarial, atribuiu, num primeiro momento, à competência individual. Depois, na sequencia, foi rebatido por Luciana Gimenez, que afirmou que “as mulheres todas são competentes”.

 

E, na resposta, Bolsonaro afirma:

“Então, a questão de salário é questão de competência... Na CLT já se garante isso. O salário compatível, desde que não haja mais de dois anos em tempo de serviço a mais entre uma e outro. Olha, isso veio [...]

 

A entrevistadora do JN insiste:

“Nós sabemos que, na prática, existe desigualdade salarial entre homens e mulheres”

 

E o candidato responde:

“Tudo bem”

 

E a entrevistadora afirma que:

“Tanto é que o IBGE mostra que as mulheres ganham 25% a menos que homens”.

 

E Bolsonaro, então, afirmou que estudou o assunto e, com a insistência da jornalista, diz:

“Por que o Ministério Público do Trabalho não age no tocante a isso daí? Passa a agir.”

 

Questionado qual seria sua postura na condição de Presidente da República, o candidato afirma que:

“Mas eu não tenho ingerência no Ministério Público do Trabalho, isso está na CLT. É só as mulheres denunciarem, o MP do Trabalho vai atuar no assunto”.

 

Questionado se não fará nada para corrigir essa diferença, afirma que:

“Olha, mas é lógico que a gente faria, mas estou falando que o Ministério Público do Trabalho pode ser questionado. Eu estou vendo aqui uma senhora e um senhor, eu não sei ao certo, mas com toda certeza há uma diferença salarial aqui, parece que é muito maior para ele do que para a senhora. São cargos semelhantes, semelhantes, são iguais […]”

 

Nesse momento, discussão se inicia com a afirmação de Bolsonaro de que, ambos, na bancada do JN ganham salários diferentes. A apresentadora interrompe dizendo que jamais aceitaria tal diferença. No limite, houve equívoco do candidato pois Bonner é Editor-Chefe do JN e, também, apresentador e Renata Vasconcellos é apenas apresentadora do JN e, sendo assim, há um porquê da diferença salarial. Inclusive, Vasconcellos afirma que ela pode questionar o salário de um deputado e que o seu salário, privado, diz respeito apenas a ela, mas Bolsonaro responde dizendo que a Rede Globo recebe bilhões de propaganda oficial do Governo. Enfim, uma discussão que, em tudo, não contribuiu para melhor aclarar a questão salarial no que tange à questão de gênero.

 

Bonner, na sequência, foca nos empregos:

“Candidato, vamos falar de emprego, então. Vamos seguindo falando de emprego. É um tema importantíssimo também neste momento. O senhor tem dito que, para ter mais emprego, é preciso ter menos direitos trabalhistas. Eu pediria ao senhor que explicasse. Num governo Bolsonaro, quais direitos trabalhistas os brasileiros deixarão de ter?”

 

Bolsonaro responde:

“Faltou um pedacinho antes. Eu tenho falado em todas as reuniões que eu faço, há quase quatro anos, em palestras pelo Brasil, que a classe empregadora - são os comerciantes, são os industriais, os empresários - tem dito o seguinte. Eles têm dito o seguinte: um dia o trabalhador vai ter que decidir: menos direito e emprego ou todos os direitos e desemprego. Por que isso? O custo do Brasil ...”

 

E Bonner questiona:

“Mas quais são os direitos trabalhistas que o senhor como presidente tiraria?”

 

O candidato:

“Esses direitos estão previstos no artigo 7º da Constituição, cláusulas pétreas, nenhum pode ser retirado. Nenhum pode ser retirado. O que nós temos que fazer, aí parte do Executivo, nós temos que desonerar a folha de pagamento, nós temos que desburocratizar, nós temos que desregulamentar muita coisa. Evitar que, para se abrir uma empresa, leve em média, aí, cem dias no Brasil. E isso tem que fazer para ajudar a ter emprego no Brasil. (…)”

 

Outro ponto abordado na entrevista foi o fato de que Bolsonaro votou contra a PEC dos trabalhadores domésticos, que deu a eles, trabalhadores, os mesmos direitos dos demais. Questionado porque votou contra, o candidato afirmou que:

“Foi para proteger, o que eu defendia são os mesmos direitos, mas de forma gradativa. Levou milhares, milhões de senhoras e alguns homens que exerciam o trabalho doméstico para ser o quê? Diaristas. E como diaristas não estão, sequer, grande parte deles, recolhendo para a sua Previdência. Então tem que ser devagar. Muita gente teve que demitir, porque não teria como pagar, muitas mulheres perderam o emprego exatamente pelo excesso desses direitos. Essa foi a minha intenção. Nada contra…”

 

Em síntese, os entrevistadores do Jornal Nacional iniciaram suas questões a Bolsonaro com uma afirmação do próprio candidato de que não entendia de economia e, ato contínuo, questionam acerca de sua relação com seu provável ministro, caso seja eleito, Paulo Guedes. No caso, as questões e respostas foram mais próximas das questões de gestão e liderança, de como seria o relacionamento hierárquico entre ambos do que, especificamente, sobre as ideias econômicas de Guedes. Diante dos graves problemas econômicos enfrentados pelo país e do fato concreto de que o eventual eleito não é o assessor econômico, perdeu-se a oportunidade de escrutinar o candidato em relação ao tema, para que a população pudesse melhor avaliar seu grau de preparo para assumir a Presidência da República.

 

Ainda assentado em afirmações do próprio candidato questionou-se sobre a diferença salarial entre homens e mulheres e quais seriam, concretamente, suas propostas de como buscar solucionar esse problema. Segundo Bolsonaro, trata-se de acionar os órgãos competentes, como, por exemplo, o Ministério do Trabalho, já que a Constituição Federal garante igualdade perante a lei. Aqui há uma questão delicada. Do ponto de vista econômico, como  já mostrou o prêmio Nobel de economia Gary Becker, não faz sentido discriminar, pois, prevalecendo a lógica econômica, quem discrimina paga um preço por discriminar, uma vez que, sendo igual a produtividade do grupo discriminado em relação ao grupo não discriminado, bastaria que seus competidores oferecessem salários mais altos do que o empregador que discrimina, para obterem ganhos. A própria disputa por esses recursos humanos, em princípio mais baratos, faria com que o diferencial de salários tendesse a desaparecer, enquanto quem discrimina acaba sendo penalizado por custos mais elevados. No entanto, afirmar a realidade a partir de abstrações teóricas, sem as devidas mediações é incorrer em vício ricardiano. Os dados do IBGE não permitem descartar a existência de discriminação de gênero no Brasil. A teoria, primeiramente, parte do pressuposto de racionalidade plena, mas o que muitas vezes se observa na prática é racionalidade limitada. Além disso, não se pode desconsiderar as distorções da competição imperfeita. Por fim, a discriminação é um fenômeno social tão reprovável quanto complexo, para o qual a Economia não tem a resposta definitiva, que deve contemplar as contribuições de outros campos do conhecimento, sobretudo das Ciências Sociais.

 

Outro ponto importante da entrevista foi o fato de que, para Bolsonaro, os trabalhadores terão, em algum momento, que escolher se preferem “direitos” ou “empregos”, pois, segundo ele, o “custo Brasil” (burocracia, etc.) impede uma maior e melhor geração de empregos. Na mesma linha de direitos e empregos, foi questionado porque votou contra a aprovação da PEC dos empregados domésticos. Segundo a visão do candidato, eles – os empregados domésticos – deveriam, sim, ter os mesmos direitos, mas de forma progressiva, pois o que acabou ocorrendo foi a geração de mais desemprego, uma vez que os patrões dispensaram, por exemplo, suas empregadas domésticas para transformá-las em diaristas, inclusive sem condições de contribuir para o INSS. As duas questões acabam versando sobre os custos trabalhistas, decorrentes do grau de proteção ao trabalhador, no Brasil. Do ponto de vista econômico, é inegável que, quanto maiores os custos trabalhistas, menor a demanda de força de trabalho. Nessas condições, quem encontra emprego formal fica em situação privilegiada, enquanto os excluídos do trabalho formal ficam em situação precária. Os entrevistadores, por sua vez, diante da conhecida posição do candidato em relação ao tema, de que para ampliar a quantidade de empregos será necessário renunciar a direitos, têm razão em questionar como Bolsonaro pretenderia reduzir os custos trabalhistas. No entanto, a forma de questionar - “Quais direitos trabalhistas os brasileiros deixarão de ter?” - não contribuiu para o debate. O tema envolve a competitividade do Brasil, que, no limite estabelece as possibilidades de crescer, gerar empregos e melhorar as condições de trabalho de maneira sustentada. Por que não aprofundar a questão, avaliando as condições trabalhistas de países com características semelhantes, em termos de renda per capita, recursos e que competem com o Brasil, para questionar o que pode ser feito para que internamente as condições legais de trabalho sejam competitivas com aquelas nações? Colocar o tema de forma racional possibilita aos eleitores avaliar os diferentes aspectos da questão para formar sua opinião e tomar a sua decisão.

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