Em busca de liberdade

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Carta de Princípios 2003

20.05.2003 Chancelaria

Rev.Ms. Eldman Francklin Eler e Rev. Ms. Saulo Marcos de Almeida


O Instituto Presbiteriano Mackenzie nasceu em 1870 e persiste no seu compromisso histórico de ser fiel à sua tradição e pioneirismo na tarefa de educar melhor, comprometido com os princípios éticos emanados da Bíblia Sagrada. 

O Chanceler da Universidade Presbiteriana Mackenzie apresenta essa "Carta de Princípios" para o ano acadêmico de 2003, recomendando sua leitura e reflexão, com o propósito de que os valores essenciais da formação do ser humano estejam sendo firmados. 

A Chancelaria e a Capelania Universitária oferecem o presente documento, desejando que ele contribua para o exercício de reflexão sobre a Liberdade, como princípio fundamental que permeia as instâncias sagradas e profanas da vida humana, conforme criada por Deus, na definição dos valores necessários e indispensáveis ao pleno exercício da cidadania. 
 

Rev. Dr. Osvaldo Henrique Hack
Chanceler da Univ. Presbiteriana Mackenzie



Em Busca da Liberdade

Embora se admita a Revolução Francesa como o mais conhecido apelo histórico à liberdade, acredita-se que o tema em questão tenha sua origem no legado deixado pelo cristianismo, ao revelar para o ser humano a sua propriedade de pessoa livre, chamada à comunhão com Deus através do evangelho de Jesus Cristo. 

Essa herança caracterizou as ênfases ideológicas do movimento reformado do século XVI: liberdade de consciência e livre exame dos textos bíblicos. 

Por essa razão, Hegel interpretou a Reforma como um dos marcos decisivos na história da humanidade. Paul Tillich, teólogo protestante, viu no espírito do movimento, chamado por ele de "Princípio Protestante", "o guardião contra as tentativas daquilo que é finito e condicionado, de usurpar o lugar do incondicional no pensar e no agir".
 

Liberdade: garantia do ser humano

Para o cristianismo, a liberdade é uma das mais importantes garantias da cidadania em sua plenitude, intrínseca ao ser humano criado por Deus. Não há direito mais sagrado na terra do que o da liberdade civil, social ou do pensamento. Ser livre é ser pessoa. Não ser livre é ser escravo, é ser qualquer coisa (rés), menos ser personalidade digna de si mesma. 

Disso resulta a interpretação do homem como um ser sócio-histórico, em permanente relação com o mundo e com o seu criador, capaz não apenas de reagir ao meio ambiente, mas, sobretudo apto para responder a este. A reação natural se localiza na esfera do biológico (homo sapiens), a resposta revela a dimensão da liberdade apenas no ser humano (animal rationale e symbolicum). 

Em sua existência, o homem está sempre se projetando para fora na busca constante da construção do seu ser. Não nasce pronto, acabado. Sua essência está na liberdade, por isso é capaz de elaborar utopias, ir além dos seus limites, romper com o que o aprisiona, pois é da sua natureza o destino de tornar-se livre. 


Liberdade: identidade fundamental do cristianismo

Na leitura do Antigo Testamento, a partir do enfoque da soberania de Deus, eixo central de interpretação calvinista, percebe-se a orientação divina para a busca e manutenção de uma vida harmoniosa entre os homens. A luta pela justiça nas relações humanas garantiria a paz no mundo por Ele criado. Deriva-se disso a

Sua preocupação com o órfão, a viúva e o estrangeiro. Não se aceitava como ideal de Deus a escravidão e, quaisquer que fossem os obstáculos que impedissem o desenvolvimento da dignidade humana confrontar-se-iam com as fortes aspirações à libertação do povo. O homem foi chamado para ser livre e esta liberdade é marca peculiar da criação de Deus. 

No Novo Testamento, a proclamação de Cristo "A verdade vos libertará" (João 8:32) deve indicar os referenciais para a continuidade dessa exposição teológica. Essa realidade tem na redenção realizada por Jesus a liberdade em seu significado mais poderoso, uma vez que Ele nos libertou do mal maior: o pecado e o poder da morte. Na força criativa do Espírito Santo, essa verdade deve ser apresentada a todo homem, comportando o pleno respeito à individualidade determinante de cada um.

O apóstolo Paulo define a existência cristã como um viver em liberdade: "Por que vós, irmãos, fostes chamados à liberdade" (Gálatas 5:13). A liberdade apresenta-se na linguagem paulina como uma dádiva de Deus, essência do ser humano. Mas também é uma tarefa, posto que liberdade não é a ausência de responsabilidade. A teologia e a pastoral marcadamente calvinista devem se orientar para que o cristianismo preserve a liberdade em sua plenitude na expansão do Reino de Deus.
 

Liberdade: cidadania responsável

Desde o Iluminismo, muitos foram os esforços para a plena libertação do homem. A conquista da liberdade era o objetivo maior no desenvolvimento da ciência e da técnica. Os projetos de libertação propunham o fim da dominação do homem sobre o homem. Por conseguinte, as ciências históricas e humanas destinaram-se a ajudar o ser humano na melhor compreensão de si mesmo e do próximo. 

É inegável a contribuição desses movimentos à história humana. A tecnologia desempenha um papel social relevante nos nossos dias. Ela pode curar o homem de doenças, substituí-lo nas tarefas mais árduas, garantir-lhe melhor qualidade de vida. A escravidão legal foi abolida. A lei admite a igualdade entre o homem e a mulher, a participação de todos no exercício do poder político e a socialização dos mesmos direitos. O homem procurou libertar-se das superstições e temores ancestrais que impediam o seu desenvolvimento. 

Devem-se, no entanto, levar em consideração as ambigüidades embutidas no decorrer desses processos e seus conseqüentes desdobramentos, visto que emergentes ameaças e novas servidões surgiram em meio à história recente de nossas vidas, resultando em má compreensão do próprio sentido ético da liberdade. 

A Universidade Presbiteriana Mackenzie reitera neste documento o compromisso com a formação integral de seus alunos sem prescindir dos referenciais bíblicos acerca do tema proposto. Reafirma a liberdade de pensamento para a busca da verdade em todas as dimensões do saber humano como forma de glorificar a Deus e servi-lo no mundo. Crê que a liberdade não é o exercício do individualismo, marca acentuada da atual sociedade, mas a concretização efetiva do amor (ágape cristão) nos relacionamentos humanos. Posiciona-se em favor de uma liberdade responsável, pois todo ato livre é necessariamente um ato pelo qual se deve responder: "não useis da liberdade para dar ocasião à carne; sede, antes, servos uns dos outros, pelo amor" (Gálatas 5:13).

A busca da liberdade para a construção de um mundo mais justo e solidário, na perspectiva do Criador e a serviço do ser humano, conduzirá a excelência da dignidade humana. 
 

Rev.Ms. Eldman Francklin Eler
Rev. Ms. Saulo Marcos de Almeida
Capelães da Universidade Presbiteriana Mackenzie