Desafios do comércio externo

Bolsonaro terá de fazer um ajuste na estratégia de inserção econômica internacional

19.11.201917h00 Comunicação - Marketing Mackenzie

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Desafios do comércio externo

Creomar Souza*

O Globo - Opinião - 06/11/2019

As dificuldades que o acordo Mercosul-União Europeia enfrenta, com sério risco de atraso no processo de ratificação, acendeu sinal de alerta no governo brasileiro. Diante desse cenário, tudo indica que a administração Bolsonaro terá de fazer um ajuste na estratégia de inserção econômica internacional. A eleição de Alberto Fernández, por sua vez, elevou o grau de incerteza, tendo em vista a dúvida sobre a posição a ser adotada pelo futuro governo argentino em matéria de política comercial. Ao Brasil interessa um Mercosul que siga com uma estratégia agressiva de abertura e novos acordos. O presidente Bolsonaro e seu chanceler já sinalizaram que o Brasil não aceitará retrocessos nessa frente.

Mesmo que a questão interna do Mercosul se resolva nos próximos meses, seja com uma postura em favor da abertura por parte da nova Argentina, seja alguma fórmula que permita negociações comerciais em separado de seus membros, o Brasil terá de lidar com um contexto internacional complexo, a começar pela própria União Europeia, em que resistências precisam ser vencidas. Para superar a oposição de França e de outros países, como Áustria, cujo Parlamento adotou moção contrária ao acordo com o Mercosul, é necessário um longo processo de reconstrução da confiança em relação a nossas credenciais ambientais.

Isso vai requerer, além de uma política de comunicação eficaz, que se desfaçam exageros e combatam alarmismos de toda ordem sobre a Amazônia, um esforço de reafirmação do compromisso brasileiro com prevenção e combate ao desmatamento, valorização dos dados científicos e o emprego de discurso público das autoridades que não dê margem a ser interpretado como licença para desmatar ao arrepio da lei. É preciso reconstruir a imagem do Brasil de produtor agrícola que compatibiliza a produção com sua condição de potência ambiental, aliando preservação da floresta a uma agricultura sustentável. Devemos evitar e corrigir equívocos cometidos nos últimos meses que contribuíram para semear dúvidas sobre a política ambiental e o engajamento do governo na implementação de obrigações e compromissos nessa área.

Se a recuperação da imagem positiva levará algum tempo, as necessidades de desenvolvimento não podem esperar. Paralelamente, é preciso preservar os ganhos obtidos com a modernização da agenda do Mercosul que se operou dois últimos anos, adaptar-se às dificuldades com os europeus e explorar maneiras criativas de seguir avançando. Afinal, a nova dinâmica no bloco regional já começou a dar resultados importantes, em particular o fechamento dos acordos com UE e a Associação Europeia de Livre Comércio (EFTA). Diante dos entraves na frente europeia, as demais negociações ganham relevo, mas nenhuma delas terá a capacidade de substituir o acordo com a UE como motor de nossa modernização econômica.

Na conjuntura atual, a alternativa poderia ser os Estados Unidos, país que é nosso segundo parceiro comercial (ou primeiro, se levarmos em conta não apenas comércio de bens, mas também de serviços, num valor total que se aproxima de US$ 100 bilhões anuais), o maior investidor no Brasil e, não menos importante, principal destino de nossas exportações de manufaturados. Basta dizer que, em 2018, cerca de 60% das exportações para os EUA foram compostas de produtos industrializados, enquanto essa razão foi de 40% para a Europa e em torno de 2% para a China.

O início de uma negociação comercial com os EUA ajudaria a compensar o congelamento momentâneo do acordo com os europeus, além de aumentar a atratividade relativa no mercado brasileiro aos olhos de outros parceiros importantes. Não há dúvida que eventual negociação com os EUA enfrentará obstáculos, mas nada que seja insuperável. Mesmo que um acordo de livre comércio com os EUA não seja alcançável no curto prazo, acordos setoriais e regulatórios podem gerar resultados quase imediatos e pavimentar o caminho que levará ao livre comércio. O primeiro passo, já em negociação, será a celebração de um acordo de reconhecimento mútuo de Operadores Econômicos Autorizados, medida de desburocratização do comércio exterior que baixará custos para empresas credenciadas de ambos os países.

Essa aposta dos EUA aumentaria o valor, para a Europa e outros grandes atores da economia global, de perseguir acordos com o Brasil. Além disso, a conclusão de acordos ambiciosos ajudaria na agenda de reformas necessárias para aumentar a competitividade sistêmica da economia e garantir ambiente mais amigável aos negócios. A abertura comercial não é a panaceia para todos os nossos problemas, mas um forte estímulo para adoção de disciplinas modernas, desoneração da produção e novos investimentos em infraestrutura e inovação, elementos essenciais do sucesso econômico no século XXI.

As incertezas no Mercosul e as dificuldades de ratificação do acordo com a UE, longe de servirem de desalento, devem ser estímulo adicional para persistir no caminho de abertura e para utilizar a parceria estratégica com os EUA a favor da nossa estratégia mais ampla de relacionamento comercial externo.

Creomar de Souza é professor convidado da Faculdade Mackenzie em Brasília.  

 

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Rafael Querrer 

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